domingo, 15 de novembro de 2009

De quem tem asas



Ele era doce e gentil. E por sua gentileza e doçura, fez da minha vida amarga, uma bebida com melhor sabor. E, saborosamente, soube exercer o fascínio das melhores qualidades que um amigo pode ter. E de modo natural, se fez gente.


Ele abriu suas asas de anjo que ainda era, que nunca deixaria de ser, e pousou suave em um terreno diferente, e com sotaque envolvente, em sua língua, que eu não sabia como era, se colocou a falar. E utilizando das palavras, ele descobriu o som, e dele a música e por meio dela chegou a mim. Com palavras ele voltou a lidar.

Ele me achou perdido em um lugar qualquer e sequer sabia que eu ali estava. Já o esperava, mas não sabia. Nem ele. Ele se mantinha reservado, mas acabou por falar. Sua voz percorreu os limites da distância e, mergulhando nos corredores da memória, se aprofundou no tempo. Fez-se atemporal em temporal de emoção. Em pouco tempo na terra, o anjo já mudava vidas.
Anjo notou que já não era só uma vida que mudava. Ele me disse que mudava sua própria vida. Ele falou de seu passado e de seu presente, e presente se fez. Presente de tempo; presente de substantivo palpável, como caixa com laço de fita, não tão palpável assim, não tão fácil de embrulhar.

Ele brincava com as letras. As dominava. Não com a brutalidade de um carrasco, mas como um carinhoso amigo que sabe conversar com elas. E seus diálogos se faziam espelho. E suas poesias se faziam lugar.

Anjo brincou com os elementos da natureza. E, de dentro do mar, em tarde em que a brisa fazia pequenas ondas, fez nuvem para nós. E, lá de cima, me mostrou como eu podia enxergar diferente o verde da Terra. Mostrou, sem querer, como eu podia ver com outros olhos a todas as coisas. Pensamento.

E todas as coisas impedem que ele voe para longe. Ao meu encontro, anjo em pessoa não pôde vir. Porém, se o anjo com asas ainda não pode me proteger com elas, sem elas ainda pode voar. E, se até eu, não-anjo, me vejo voando, prefiro rumar para as nuvens de nossos sonhos, a manter os pés constantemente no chão.

Anjo e pessoa têm tanto para sentir e contar. Tantas coisas fazem! Tantas coisas mudam... Mas, o fato é que, diariamente, eu, pessoa, dedico meu tempo para a um anjo orar. De algum ponto do universo me ouve. De meu ponto sinto seus sinais. Anjo que cuida de mim.
Bate vontade... Vontade de ganhar asas, voar ao seu encontro, senti-lo perto e o abraçar.

Anjo que conversa com o céu e interpreta as estrelas. Não sei em que astro ele está, mas isso não importa muito. Se estamos longe no espaço, estamos próximos na emoção...

Nessa hora, algo leve percorre minha nuca. Algo suave percorre a linha invisível entre meu pescoço e as minhas costas. Agora, sinto um ventinho leve ao longo de todo o meu dorso. Vejo-me arrepiado. É como se sentisse a brisa de um bater de asas junto a mim.
E meus olhos se fecham e, no acalanto dessa noite de chuva, adormeço para sonhar...



André Medeiros, 15/11/2009

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